sexta-feira, 1 de maio de 2020

A Fonte da aldeia no 1º de Maio

Hoje é o Dia do Trabalhador, mas naquela época dos anos cinquenta e sessenta do século passado, por vivermos sob o jugo do regime fascista, esta data não era comemorada, porque as represálias eram tremendas. 

Foto da fonte à época Créditos: DR
 No entanto, neste dia, na minha aldeia havia uma tradição que todos os anos se repetia.
A Fonte da freguesia e uma escadaria mesmo em frente, do outro lado da rua, eram engalanadas com variadas flores, algumas envasadas, pelos jovens da aldeia durante a noite. Logo pela manhã era uma alegria e dava gosto ver aquele mar colorido e perfumado.

Durante anos pensei que era uma forma dissimulada de comemorar o 1º de maio.
Recentemente descobri que esta tradição tinha outro significado.
Os rapazes solteiros "assaltavam” durante a noite e madrugada desse dia os quintais, jardins e varandas das raparigas por quem estavam interessados ou enamorados e enfeitavam a Fonte, que se localizava no centro da aldeia. No dia seguinte quando as raparigas iam à fonte buscar água ficavam intrigadas ou aborrecidas por verem lá os seus vasos, mas, entretanto, os rapazes apareciam e era o pretexto para meterem conversa com elas. Muitos namoros assim se iniciaram e a fonte passou a ser conhecida pela fonte casamenteira.
Ainda me recordo de, ao final da tarde, principalmente no verão, o recinto da fonte ser o ponto de encontro de rapazes e raparigas para amenas conversas ou namoricos. 
Deste facto me deu também testemunho a minha mãe.

Um dos fontanários da atualidade lindamente enfeitado

Esta tradição não terminou e nos últimos anos foi alargada aos vários fontanários que atualmente existem na freguesia.
Neste momento não são só os rapazes que os enfeitam, mas outros populares que, com todo o esmero, querem que a sua fonte seja a mais bonita. 

Uma tradição muito antiga que foi passando de geração em geração e que o povo quer manter.

30.04.2020
Imagens: Google

domingo, 5 de abril de 2020

Ofícios da minha aldeia 2 (XIII)

Na continuação do artigo sobre os ofícios da minha aldeia e para finalizar vou  enumerar mais alguns, cujas  atividades  eram muito importantes para o desenvolvimento da freguesia naquela época, finais dos anos 50 e inícios dos anos 60 do século passado. Hoje falarei do ferrador, do albardeiro, dos sapateiros, dos pescadores e do fabrico dos picaretos. 


Não muito longe do centro da aldeia, num enorme barracão anexo a uma residência existia  a oficina do ferrador.
Sempre que por ali passava gostava de observar o ferrador a alisar e, porventura, a limpar os cascos dos burros, éguas e mulas para finalmente pregar as ferraduras. Um trabalho árduo que decerto exigiria muita perícia dadas as características dos animais.


Ao lado da casa dos meus avós maternos vivia o ti Chico Albardeiro, que na sua oficina executava como o nome indica as albardas, os cabrestos e outros acessórios essenciais aos animais que ajudavam os donos nos trabalhos do campo.




Destaco também os  três sapateiros: o Ti Parente, o Ti Augusto e o ti Zé Duarte,  que manufaturavam todo o tipo de calçado para os habitantes da aldeia e que também percorriam as feiras para calçar toda uma população que vivia em lugares mais recônditos do concelho.  Estes eram já na época fonte de emprego na freguesia.
Recordo que, naqueles tempos em que o dinheiro era parco, se mandava consertar os sapatos  e colocar meias solas.



A aldeia onde nasci é formada por várias colinas, de onde se avista o Rio Tejo, que lhe corre nas entranhas. As vistas são deslumbrantes e não há ninguém que lhe seja indiferente. Todos amamos  o Tejo.

PESCA NO RIO TEJO JUNTO A ALVEGA - ABRANTES ABRIL 2017 - YouTube

Nos anos em que as águas ainda não eram poluídas havia bastantes pescadores, que ali ganhavam o seu sustento e proporcionavam aos seus conterrâneos variedade e qualidade de peixe, que esta vossa amiga, logo em pequenina, se habituou a apreciar.
Ao lado da casa de meus pais morava o Ti Vermelho, um pescador, a quem a minha mãe comprava o peixe logo pela manhã, quase acabado de pescar. 
No inverno, no tempo das cheias, o sável e a saboga faziam as delícias dos apreciadores.
Depois não faltavam as bogas, os barbos, os barbiscos, as carpas, as lampreias e as enguias.
Estes são alguns dos que mais recordo.
Ainda sobre o Ti Vermelho gostava imenso de o ver consertar as redes, trabalho que efetuava num pequeno recanto junto à casa.

Consertando a rede Foto de Reynaldo Monteiro | Olhares ...

Por fim refiro os picaretos, barcos de pesca, que  eram construídos pelo ti Fontes, calafate e pescador que faleceu  em 2017, com 90 anos, que dedicou a sua vida inteira ao Tejo. Construiu mais de 300 picaretos
.
Picareto
O Ti Fontes

Os picaretos irão fazer parte dum Núcleo Museológico do Concelho dedicado a artes e ofícios relativos à pesca, nomeadamente da minha aldeia.